quarta-feira, 9 de maio de 2012

CERIMÔNIA

Chegaram de negro.
Mãos em oração.
Véus sobre os rostos.
Choravam mediante paga.
Lágrimas na exata proporção da retribuição.
Postaram-se diante do caixão.
Ninguém mais poderia se aproximar.
Fecharam o cerco.
Muro preto, indevassável.
Pobre alma, pensavam alguns.
Era tão bom, pensavam outros.
O choro,
Que rolava das faces com indiferença,
Começou a alagar o ambiente.
Desconforto.
Pessoas começaram a se retirar,
Atônitas com a surreal cena.
Águas pelas cinturas
E o pranto ritmado,
Punham a correr os mais determinados.
Elas ficaram sós,
Sempre cumprindo suas úmidas prestações.
Movimento inusitado.
Ele sentou-se no caixão
Olhando em volta.
Tudo certo.
Tirou a carteira do fundo do bizarro catre.
Pagou a todas que, em fila, retiraram-se
Impassíveis.
Mais uma missão cumprida.
Mais um dia de provimentos garantidos.
Vendo-se só, levantou-se com cuidado.
Varreu toda a lama que se formara para o ralo,
No fundo da peça.
Livre e limpo afinal.
Abriu as janelas e deixou que o sol entrasse.
Foi até a porta no canto e encontrou a escada.
Desceu todos os degraus para nunca mais voltar.
Afinal, naquela vida,
Já constava como morto.
Agora só tinha que se preocupar em encontrar a próxima.
Avistou uma nova porta.
Respirou fundo antes do recomeço.

13 comentários:

Rogério G.V. Pereira disse...

Hoje foste inultrapassável

Cá longe
Deste lado
Sinto-me ressuscitado

E vou à vida
minha querida

Mª LUISA ARNAIZ disse...

¡Qué estoicismo! Un beso, Gisa.

Cris Campos disse...

Ah Gisa! Sempre surpreendes não é? E sempre tem algum detalhe que me faz lembrar de algo ou que coincide com meu estado... Hoje, tive um encontro com as lágrimas... Que coincidência não? Gr. Bj.amiga!

ANTONIO CAMPILLO disse...

La muerte siempre es innecesaria e implacable. El enterrador es similar a ella. Los deudos de quien ha nacido muriendo, se van a seguir sus cotidianas muertes, la vida.
Una sonoridad, en original, muy bien adaptada al contenido.

Un fuerte abrazo, querida Gisa.

folha seca disse...

Gisa
De facto é sempre um prazer cada visita ao seu blog. Impressionante como consegue colocar tão bem as palavras no sítio certo.
Um beijo amigo
Rodrigo

Julie Sopetrán disse...

Real, auténtico, comola vida misma. Me ha gustado mucho. Felicidades siempre por tu poesía.

Escritora de Artes disse...

Surpreendente!

Bjos querida amiga

Escritora de Artes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Flor de Jasmim disse...

Existe sempre uma outra porta, outros caminhos, algumas vezes em frente de nossos olhos, mas muitas vezes colocamos uma venda para não os ver.

Beijinho e uma flor

Anônimo disse...

é gisa, avistou uma outra porta, respirou fundo antes do recomeço. que direçao tomou? manuseou bem as palavras para este lindo texto. abraços lamarque

Manuel Veiga disse...

as carpideiras ao Poder!!!!

que dão vida aos mortos. rss

excelente ironia.

beijo

Sonia Guzzi disse...

Morte, recomeço, começar de novo...
É preciso coragem...
Beijo, em divina amizade.
Sonia Guzzi

Anônimo disse...

Uma dose de sageza, outra de mordacidade e outra ainda de inteligência para acabar com a hipocrisia.
Conquistado mais um leitor.
Beijo
ASA