domingo, 28 de abril de 2013

CENAS

Diante da imaginária linha divisória
Deixou-se ficar.
Verificou que
Quadro a quadro
Do filme finito
Soube estancar
No seu momento certo.
Tudo adquiriu perspectiva
E a distância cresceu.
Lá na frente
Nada mais se avistava
Do que tinha permanecido atrás.
Lá de trás
Não se desconfiava
O que haveria na frente.
O abismo fez-se,
O esquecimento veio
E o cotidiano enterrou.
Deu de ombros
E congelou
Mais uma cena.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

LENDA

Saltou através do arco de fogo
E de felino,
Fez-se mulher.
Olhos gateados,
Cabelos vermelhos,
Tez morena.
Andava sinuosa pela estepe
Confundindo o desejo
Dos seus predadores naturais.
Exalava aromas místicos
Provenientes da transmutação recente.
Com o calor do seu corpo,
Desabrochava as poucas flores
Que resistiam a sua presença
Mais bela.
Convidada pelo vento,
Foi voar perto do sol
E por lá resolveu ficar.
Dizem que se enamoraram ternamente.
Todos os amanheceres
Se despedem
Com um beijo
E após o entardecer...
Bem, após o entardecer,
Ouvem-se doces murmúrios de amor.

terça-feira, 23 de abril de 2013

REFLEXÃO

Tinha a capacidade de moldar.
Esculpia situações, rostos, sentimentos.
Nunca ninguém sabia ao certo
Em que poderia acreditar.
Dissimulação era sua arte e, assim,
Deslumbrava a todos.
Cansou-se da superficialidade 
Do se cotidiano pirotécnico.
Fechou as janelas.
Aposentou os formões.
Recolheu-se ao fundo dos seus sonhos,
Buscando o algo a mais
Que nunca encontrara.
Adormeceu de olhos abertos,
Aguardando algum desfecho.
Petrificou em suas próprias brumas
Desfazendo-se no pó.
Da ilusão que sempre foi.

domingo, 21 de abril de 2013

VALE

Não tardo.
Já chego.
Me aguarda.
Estou vindo.
Não sentes?
Sim, eu sei.
Vejo o arrepio.
O sorriso.
O suspiro.
Quase chegando.
Controla a ansiedade.
Vou fazer valer a pena
Toda a espera.
Relaxa
E aproveita.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

ROCA

Os dedos de cristal não se feriam na roca.
Fiava e desafiava a todos com sua habilidade manual
De tecer os próprios cabelos.
Cachos dourados encantavam a sala
Ao se acumularem no chão frio.
O barulho contínuo e compassado
Do pedal
Soava como música para ele.
Aproximou-se primeiro pelo som,
Foi envolvido pelo perfume,
Entregou-se à imagem,
Sucumbiu ao conjunto.
Emaranhado nas suas percepções,
Deixou-se levar, sem lutas,
Ao fuso.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

SEGREDO

Minha linha é finita.
A extremidade inicial surge do nada.
Rente ao chão.
E a final, no nada termina.
Rente ao céu.
Nunca soube o seu comprimento.
Experimento a cada passo
Para frente ou para trás,
Conforme os ventos
Do concreto e do imaginário
Me conduzem.
Equilibro-me como posso.
Ora agarrando-me às paisagens,
Ora, aos sonhos.
Minha linha é finita,
Eu sei,
Todos sabem.
Mas há algo do desconhecimento geral
Inclusive do meu.
Assim, não espalhe!
Venha cá,
Bem pertinho
Vou te contar uma vez só,
Preste atenção!
Sou ...
IN-FI-NI-TA!

sexta-feira, 12 de abril de 2013

E LA NAVE VA

Com os dentes cerrados
Absorveu o choque.
A vida seguia livre
Sem se importar com sua
Mais definitiva decisão:
Desistir de viver.

terça-feira, 9 de abril de 2013

EXPECTATIVA

A quem interessar possa:
Sou amiga,
Companheira mesmo!
Sei ouvir, mas adoro falar.
Choro e dou gargalhadas
Sem qualquer tipo de constrangimento.
Gosto muito de gostar.
Gostar forte, com alma e tudo mais envolvido.
Imaginação tenho muitas!
Posso até fornecer algumas, ainda que preferidas.
Tenho calor e sangue nas veias.
Ardo com prazer.
Não sou boa em ter paciência.
A impulsividade me consome
E a falta de pensar antes de falar se torna meu lema.
Grito.
Danço.
Sonho.
Giro.
Flutuo.
E todos os demais verbos que expressem liberdade.
Agora, com a alma exposta, me recolho para aguardar.
Será que alguém irá se interessar?

domingo, 7 de abril de 2013

ANTINOMIA

Um dia foi
Não significa que será
Ou que, simplesmente, é.
A lógica da existência
Necessita do ser ou não ser
No seu show de luzes.
Sombras e clarões
Brincam sob, sobre, na frente e atrás
Das cortinas.
Assistirei.
Assisto.
Assisti.
Sigo sempre em frente.
Com ou sem trilha sonora.
Sigo de olhos fechados.
Não quero me apegar.
Não quero esperar.
Não quero encontrar ou abandonar.
Não quero,
Quero,
Não quero,
Quero.
Não
Quero.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

GUARDIÃ

Dormes.
Guardo teu sono.
Acalanto teus sonhos.
Conforto tua alma.
Aqueço teu corpo.
Sou fluída.
Ocupo todos os lugares
A teu entorno
Sem te importunar.
Hoje não permitirei que nada te atordoe.
Nada.
Dorme em paz.
Eu cuido...

terça-feira, 2 de abril de 2013

RASCUNHO

Fez um rascunho
E deu-lhe a vida
Com um sopro quente.
Desengonçado,
O feio desenho,
Levantou-se do papel
Dando os primeiros passos
Até à beira da mesa.
Suspirou aflito
Sem saber como proceder.
Mirou o precipício
Que surgia na ponta dos seus
Rotos sapatos de garatuja.
Em colossal salto,
Jogou-se no nada
Buscando, aflito,
A razão 
De um dia ter sido.