segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

REBELDIA

Desaforadas as lembranças que correm pela sala tentando se fazerem perceber.
Audaciosas as lembranças que imaginam que ainda são importantes de serem vistas.
Loucas as lembranças que desafiam a realidade do presente como se ainda fizessem parte dele.
Doces as lembranças que nos fazem sorrir com a sua irresignação.

sábado, 29 de janeiro de 2011

PROCURA

O vidro se fechou
Fostes desaparecendo ponto a ponto da minha linha de visão.
O ciclo havia se encerrado.
Coitadas das lembranças e sensações...
Não foram avisadas do final da história
Agora vagam cegas
Condenadas a insensatez da procura
Buscando as almas
Que lhes foram, abruptamente, sonegadas.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

CONTATO

Não consigo mais ter clareza nas lembranças
Teu rosto já está encoberto pela névoa do tempo
Muito pouco recordo do teu sorriso
Mas tuas mãos ainda queimam em mim,
Por sorte,
O contato do fogo nunca se acaba.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

PROPAGANDA

Sou teimosa, falante, não desprezo uma boa gargalhada e sei ouvir muito pouco.
Gosto que prevaleça minha opinião, mas concordo em discutir e, se tiver que mudar de ideia, mudo.
Sei ser amiga, companheira, mas também aprecio momentos só meus pelos quais brigo com unhas e dentes para que assim permaneçam
Imaginativa e sonhadora detesto realidade, odeio cotidiano e não suporto manter meus pés no chão.
Choro quando tenho que chorar, mas depressão leva, no máximo, cinco minutos, sempre sigo em frente.
Entre praia e cidade fico com a cidade. Adoro o concreto e me deprime a natureza envolvida na cena de uma bucólica casinha do campo, com pássaros cantando e vacas mugindo.
Da tempestade adoro o cheiro, os raios e os trovões. Vento forte e nuvens que correm pelo ceu também me seduzem.
Da noite, fico com as de lua cheia e estreladas, mas não descarto as outras fases da lua, ela realmente mexe muito comigo.
Gosto do sol forte e do frio intenso, o primeiro com piscina e champagne e o segundo com lareira e vinho tinto.
O contato físico me encanta, seja ele em forma de dança, seja ele em forma de amor.
Sou muito boa em uma cama e em uma cozinha, mas não me mandem arrumar e limpar uma casa, viro bicho. Tudo bem, modéstia não é o meu forte.
Sou uma mãe excepcional.
A leitura é uma das minhas mais caras paixões e o estudo, um vício do qual acho que nunca vou me recuperar, o que eu detesto mesmo é trabalhar, mas fazer o quê?! Mal necessário, assim, trabalho, e muito.
Não sou cara, tampouco barata. Aprecio fazer compras (Advertência: Este item já foi completamente controlado pelo psiquiatra, assim, sou comedida com despesas, ou ao menos tento).
Caso você se interesse, sou aquela sentada na prateleira sorrindo entre o ursinho de pelúcia e o boneco de chapeu engraçado.
Entre e compre.
Mas pense bem, a loja não aceita devoluções...

domingo, 23 de janeiro de 2011

APARIÇÃO

Barulhos de caixas caindo, objetos chutados e passos rápidos
Ergue-se a cortina.
Surge uma cena plácida. Algumas pessoas sentadas tomando chá. Rostos sem expressão. Roupas sóbrias. Conversavam em voz baixa sem, aparentemente, perceber os sons que iam aumentando no ambiente.
De um canto escuro surge, em meio a um estardalhaço, uma figura desalinhada, vibrante, mas empoeirada, como se tivesse sido feito prisioneira há muito e somente agora conseguisse se libertar.
Ninguém olha. Seguem os diálogos comedidos.
A nova figura corre por todo palco. Sobe nos móveis e os derruba. Desorganiza os cabelos das senhoras sentadas, cospe nos ternos impecáveis dos senhores discretos.
Ninguém olha. Seguem os diálogos comedidos.
Impressionada com o descaso, a nova personagem põe-se a cantar, em alto e bom tom. Dá gargalhadas, grita...
Ninguém olha. Seguem os diálogos comedidos.
Vira cambalhotas e solta urros de “Estou livre agora! Eu voltei! Nunca mais irão me acondicionar nas malditas caixas empilhadas na prateleira do sótão! Catalogadas por datas e assuntos! Enganei os guardiães e estou aqui! Encarem-me! Falem comigo!”
Ninguém olha. Seguem os diálogos comedidos.
A espantosa aparição silencia, deixa os braços caírem, corre o sorriso do rosto, vai aos poucos derretendo, frustrada pela falta de atenção e, resignando-se com sua sina de lembrança, deixa-se aprisionar lentamente desistindo, naquele momento, de tentar mudar o curso dos caminhos, que nascem sob seus pés e vão aos poucos a emaranhando e amordaçando, recolhendo-a para o túmulo do passado de onde não poderia ter fugido.
Ninguém olha. Seguem os diálogos comedidos.
Cai o pano.

sábado, 22 de janeiro de 2011

PASSEIO

Gostava de passear em ruas lotadas.
Caminhava, vagarosamente, no meio da multidão
Adorava o poder que o contato com os desconhecidos lhe causava
Não sabia nomes, tampouco rostos
Diluía-se na paisagem do concreto
Sumia, anonimamente, nos bueiros
Onde permanecia, quieta,
Com medo que a Natureza lhe descobrisse.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

BEIJO

Quando saístes não fechastes a porta
Não dissestes me esquece
Não sorristes
Não chorastes
Quando saístes apenas me destes um beijo
Que aprisionei em meus lábios
Na esperança de que,
Um dia,
Retornes para buscá-lo.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

CELA

As paredes de gelo impedem que eu escape
Estou exposta.
Pessoas vêm,
Observam,
Uns rápida e outros com mais vagar,
Mas todos vão embora.
Fico solitária a mercê do sol forte
Que foge entre as nuvens
Na teimosia de somente derreter a cela
Quando melhor lhe aprouver
Desde que seja
L
e
n
t
a
m
e
n
t
e.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

PRISÃO

Carrego-te tatuado na minha garganta
Minhas pupilas não conseguem esquecer o sabor das tuas íris
Teus cabelos ainda estão entre meus dedos
O suor que pingou do teu corpo
Alojou-se nas crateras que ele mesmo se encarregou de abrir na minha pele.
Tua língua ainda passeia por todos os caminhos do meu corpo,
Sem pressa.
Teus dentes,
Ah teus dentes, encarregam-se de me aprisionar junto a tua lembrança.

PROCESSO

As palavras dançam,
Querem ultrapassar as inocentes folhas brancas,
Que, assutadas, tudo toleram.
Árduo processo de materialização!

sábado, 15 de janeiro de 2011

FANTASMA

Um prédio, vários pavimentos, muitos corredores, infinitas salas
Luzes que ora se acendem, ora se apagam
E, por muitas vezes, mantêm-se no lusco-fusco do fundo da retina.
Pessoas circulam em meio ao estardalhaço ou do silêncio conforme lhes convêm
Umas cegas, outras arrependidas por verem demais.
Nem todas se conhecem, mas todas participam de histórias
Relatos que nunca irão se cruzar, pois os andares são invioláveis,
Lacrados.
As tramas são diversas e os finais nem se vislumbram ainda.
Só existe um ponto em comum que circula por todos os ambientes,
Sorrateiramente pela escada de incêndio,
Caminho invisível aos demais,
Vivendo todas as histórias ao mesmo tempo,
Controlando, muitas vezes, o desenrolar de cada trama
Assumindo papeis e figurinos
No árduo desempenho de sua tarefa multifacetada...
A figura translúcida do meu fantasma.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

SERMÃO

Decepção... Tristeza...
O que seria grande tornou-se insignificante.
Por que deveria ser assim?
Era para ser assim.
Acorda da loucura e cospe o amargo da boca.
O despertar cega muito mais do que o adormecer,
Talvez por isso as lágrimas se façam necessárias...
Quero ir voar mas entendi o recado e planto-me cada vez mais no chão.
Aprende a ouvir as mensagens subliminares da mente.
Não te faças de louca por que não és surda, tampouco despreparada!

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

CENA ÚNICA

Uma sala, muita cumplicidade.
Fios cintilantes, que saiam dos olhos,
Criavam um liame mágico
Envolvendo-os como se fosse um casulo,
Esconderijo ideal,
Inexpugnável pelo mundo exterior
Que restava adormecido
Por acreditar na monotonia da tarde chuvosa.
Contemplação e mudez
Bocas atônitas, unidas e mãos ávidas, rápidas
Corpos sobrepostos, emoldurados pelo tapete felpudo
Sussurros, suspiros e gritos abafados
Sorrisos, muitos sorrisos
Autônomos,
Não necessariamente ligados aos lábios.
Reflexos do prazer que vertia de dentro dos umbigos
Escorria pelas pernas
Causando arrepios às borboletas que habitavam os estômagos
Saciedade e despedida.
Cena única, encantamento eterno
Vedado reedições.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

EXPECTATIVA

Queria dizer-te tantas coisas, mas estas são de difícil compreensão até mesmo para mim.
Um dia ainda irei decifrar os hieroglifos da minha alma,
Será que podes esperar?

INVISÍVEL

Esperava há tanto tempo que nem tinha mais certeza do seu próprio querer. Acostumara-se com a ausência e com o desejo latente. Não conseguia mais discernir o tempo que existia entre o início e o momento atual. Os dias, as horas, os minutos, os segundos, as estações, dos anos emaranhavam-se nos seus cabelos, amordaçavam sua boca, paralisavam suas pernas... Mas aquela noite era especial, havia chegado o momento. Arrumou-se com cuidado, banhou-se e perfumou-se. Saiu de casa deixando a chave e batendo a porta com determinação. Encaminhou-se para o lago que, sob a luz do luar, abriu-lhe uma porta com uma escada que descia em espiral. Entrou convicta e desapareceu do mundo visível para encantar o invisível.

sábado, 8 de janeiro de 2011

QUERERES

Quero desenhar arabescos na tela que chamas de corpo com os fios dos meus cabelos.
Quero desfazer os teus contornos com os pingos do meu suor.
Quero , com o calor dos nossos desejos, amalgamar a minha silhueta a tua e brincar de surreal.
Quero tatuar meus dentes no teu peito na tentativa de furtar-te um pouco de ti mesmo.
Quero tua voz dentro de mim na ânsia de atender tuas vontades da melhor maneira que eu posso, ou, da pior maneira que desejares...
Quero o teu prazer para alimentar o meu êxtase,
Quero, quer, que,qu, qu, q,  ...

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

COTIDIANO

Os pensamentos voam como bolhas e estouram com o contato com as paredes.
A sala é apertada e quatro pessoas fingem concentração dentro do universo reduzido do campo de visão alheio.
Nuvens negras de frustrações e problemas inconfessáveis passeiam de mãos dadas pelos corredores.
Como é confortável a infelicidade geral...

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

INCANDESCENTE

Vem, estou te esperando
O fogo já consumiu tudo o que eu tinha por dentro
Estou oca na expectativa da tua chegada
A lava, que escorre das minhas entranhas,
Está te espreitando
Só esperando o momento certo para te derreter
Não fiques com medo
Afinal,
Não é todo dia que podemos nos dissolver
Misturados e incandescentes,
Na paisagem...

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

FIM

Cansei. Assim não dá mais.
Enjoei de tanto esperar.
Eu já sabia que os tempos eram descompassados
E que teriam este fim.
Estava me enganando apenas...
Nunca aconteceu e jamais irá se concretizar.
Podes ficar com teu quebra-cabeças de conceitos e pressupostos
Deixa-me com meu caleidoscópio de prazeres.
Nunca alcançaríamos o meio termo
És um rascunho em preto e branco
E eu,
Uma arte final em colorido.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

VIAGENS

Ultrapasso os limites do aceitável.
E quem determina o que é o aceitável?
O senso comum.
Ah, se é comum,
Não me interessa...

domingo, 2 de janeiro de 2011

DESCONSTRUÇÃO

Tento esquecer o que nunca houve.
Apagar lacunas.
Ausências brancas e
Buracos negros ,
Onde o desconhecido é dotado de força magnética
Quero sair para respirar o ar rarefeito
Embora pouco, ainda é ar
Meus pés cada vez mais enterrados no lodo
Impedem que eu possa fugir.
Desconstruo-me lentamente.